A licitação é a forma constitucionalmente prevista para que a Administração Pública realize a contratação de obras e serviços. Por meio da licitação pretende-se assegurar a observância de diversas garantias, como a livre concorrência e, sobretudo, a obtenção da proposta que oferece maiores vantagens para a Administração, de modo a atender a supremacia e a indisponibilidade do interesse público. Infelizmente, não obstante a importãncia do atendimento aos princípios da licitação, atualmente verifica-se um extenso número de investigações e denúncias da existência de fraudes nestes procedimentos.
Recentemente, em agosto de 2008, a Justiça Federal recebeu uma ação do Ministério Público Federal, no Distrito Federal, solicitando a anulação de um contrato administrativo firmado entre a construtora Gautama e a Administração Pública, sob a alegação de fraude e mitigação da competitividade.
A licitação aconteceu em 2001, na modalidade Concorrência, utilizada para obras e serviços de alto valor e que apesar de indicar um procedimento mais lento e oneroso, também implica numa maior abertura para a participação de quaisquer interessados, com ampla publicidade do instrumento convocatório e universalidade, já que dispensa qualquer necessidade de cadastramento prévio, exigindo dos interesasdos apenas os requisitos mínimos do edital.
Segundo o Ministério Público a fraude na licitação teria ocorrido em virtude de um acordo entre a empresa contratada e os demais concorrentes, pelo qual a Gautama se comprometia a sub-contratar as demais empresas para a execução de parte das obras. Neste sentido, é importante salientar que a lei de licitações, em seu art. 77, inc. VI, inclui as sub-contratações, não previstas no edital ao qual as partes estão vinculadas, como um dos motivos para rescisão unilateral do contrato por parte da Administração Pública, uma vez que a contratação se da mediante habilitação jurídica, técnica e fiscal, não sendo tal habilitação constatada em relação às demais empresas sub-contratadas indevidamente.
Além disso, o Procurador da República também salientou a evidente violação do princípio da competitividade. Ora, uma vez que a licitação pretende buscar a melhor proposta, sendo a igualdade entre os participantes um dos alicerces da licitação, o princípio da competitividade vem justamente para assegurar que não haja nenhum favorecimento a qualquer dos contratantes, não apenas por parte da Administração, mas de todos os participantes do procedimento licitatório.
Outra questão apontada pelo procurador foi o prejuizo causado à Administração, uma vez que a violação cometida pelas empresas afeta a possibilidade de obtenção da melhor proposta, enfraquecendo a competição e obstando, portanto, a supremacia do interesse público. A gravidade de tal conduta fica manifesta na lei de licitações que impõe à prática de fraude mediante qualqeur espécie de ajuste ou combinação que frustre a competitividade da licitação a qualidade de crime, prevendo para aqueles que realizarem esses atos a pena de detenção de até quatro anos, além de multa.
O Ministério Público, que só tomou conhecimento da fraude em 2004, quando uma das empresas envolvidas entrou com uma ação contra a Gaytama por descumprir o acordo, pede à 16ª Vara Federal do Distrito Federal a anulação da licitação e todos os contratos dela decorrentes e a devolução integral dos valores, ou ao menos os recebidos pela empresa a título de lucro.
Deste modo, o que se vislumbra na situação exposta é a tentativa de anulação, ainda que haja previsão da possibilidade de anulação de oficio pela Administração em caso de ilegalidade, embora com necessidade de abertura para a ampla defesa. Neste caso, anulada a licitação, os contratos dela decorrentes também o são, automaticamente, devendo as partes retornar ao status quo anterior, sendo neste sentido a solicitação do Ministério Público da devolução dos valores já prestados, sem prejuizo das sanções decorrentes da fraude.
Assim, verifica-se que apesar da existência de tentativas de fraude aos procedimentos licitatórios realizados pela Administração, a legislação disponibiliza diversos instrumentos para a apuração, denúncia e punição dessas irregularidades, garantindo, adima de tudo, a proteção do interesse público.
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NOTA: Esse artigo foi escrito originalmente como complemento das atividades de avaliação do 3º Bimestre na disciplina de Direito Administrativo na FDSBC. O texto foi produzido a partir da notícia publicada n’O Globo On-Line, em 25/08/2008 visando uma análise dos aspectos relacionados à matéria ministrada no bimestre.