Quando você entra na faculdade de direito você aprende que a única resposta que dificilmente está errada em qualquer situação é “Depende”. Um dos motivos para responder isso é que em diversas situações observamos juizes distintos, em casos similares, proferirem sentenças bem diferentes dependendo do caso concreto.
Mas uma coisa que eu aprendi bem nesses anos de faculdade é que discutir se alguém tem direito (direito material mesmo) nada tem a ver com discutir se a pessoa ganharia uma demanda nesse sentido, até porque os processos dependem de prova e muitas vezes a pessoa tem mesmo o direito, mas não consegue prova-lo.
Ainda assim, para além da discussão sobre a possibilidade de conseguir ou não ganhar um processo, percebi que muitas vezes as respostas de professores para a mesma pergunta dependem muito do seu ramo de especialização. Um professor de Direito Civil e um de Direito Administrativo podem acabar te dizendo coisas completamente opostas sobre a possibilidade, por exemplo, e gravar com onus real de garantia os bens públicos (ainda que dominicais). Dois professores de Direito Penal podem te dar respostas diferentes sobre a aplicação de determinadas agravantes ou beneficios dependendo de terem atuado mais como advogados de defesa ou promotores.
Por que eu estou dizendo isso?
Porque no ultimo Podcast Decodificando nós falamos sobre Direito do Consumidor e recebemos todo tipo de ponto vista sobre a aplicação da responsabilidade objetiva do Código de Defesa do Consumidor à questão do furto de notebook dentro de um ambiente do hotel (o restaurante).
Eu respondi de cara que achava que existia a responsabilidade objetiva, mas tanto a Rachel Barbosa quanto o Danyllo (do blog argumentandum) discordaram desse ponto de vista. Vocês podem ler os argumentos nos devidos links, mas em geral a maioria dos argumentos no sentido de que não há a responsabilidade do hotel são relacionados com a questão da culpa (se existe culpa do consumidor, se existe culpa do fornecedor.
Eu fiquei muito feliz que o podcast tenha gerado essa discussão e que os blogueiros que trabalham/estudam direito tenham aparecido para dar suas opiniões, não só porque acho isso maravilhoso para fomentar o debate, mas porque também me ajudaram a pensar.
Ainda assim, depois das argumentações, eu continuo achando que há responsabilidade objetiva do hotel (independente de culpa) e que ainda que haja um pouco de culpa do arcanjo, não há culpa EXCLUSIVA do consumidor.
Vou deixar as questões sobre esse caso para o Decodificando, mas o que eu queria falar aqui é que eu fiquei pensando um pouco nos motivos pelos quais uma coisa que parecia tão clara para mim podia ainda ter tantas opiniões divergentes, e me lembrei que no meio do ano passado eu tinha feito um curso de férias sobre Direitos do Consumidor, com um professor que era especialista em Direito do Consumidor e tinha uma visão muito forte sobre a responsabilidade do fornecedor na Relação de Consumo.
Esse foi o meu primeiro contato com Direito do Consumidor e acho que isso foi determinante na minha visão sobre o assunto, apesar de eu ter muitas influências de proteção dos hiposuficientes no Direito, e talvez por isso me pareça que o Código de Defesa do Consumidor deve ser aplicado em beneficio do cliente do hotel nessa situação.
Isso me fez pensar sobre como as especilizações dos advogados influenciam na maneira como eles interpretam os casos e como isso pode interferir nos julgamentos quando esses advigados se tornam juizes. Não que eu ache que nada disso é ruim, mas demonstra como fatores alheios à propria causa podem afetar o seu desfecho.
Conclusão
No universo do Direito há sempre um doutrina para cada ponto de vista de uma situação e na prática há sempre um advogado para defender esses pontos de vista e um juiz para optar por eles. E no fim das contas tudo isso faz parte da dinâmica do judiciário, se não houvessem diversos modos de ver e interpretar a mesma situação não haveria muito o que discutir na Justiça.
O que eu acho mais importante nisso tudo é que as pessoas possam observar os argumentos e formar seus próprios convencimentos; e em cada relação elas possam decidir se acreditam que seus direitos foram violados; e se acreditarem que houve violação dos seus direitos que possam recorrer ao Estado; e se chegarem ao Poder Judiciário que possam ter um advogado para defendê-las.