Esse é um post para falar de uma coisa que esta me perturbando desde o ultimo domingo (06/07/08), que é classificação indicativa.
Me lembro da abordagem desse tema num seminário de Direito Constitucional sobre Censura. A princípio eu não entendo que os dois conceitos sejam semelhantes, já que a classificação etária é mais um critério indicativo para que os pais controlem os conteúdos acessados pelos seus filhos (não se proibe ou veda ou produto ele pode ser consumido livremente, mas fica avisada a recomendação).
Alias, não posso deixar de lembrar que censura sim é a proibição de jogos de video game feita por alguns juizes. Para mim isso é um caso que deveria chegar ao STF, pois é uma violenta violação à liberdade individual (mas isso é assunto para outro dia).
O que eu me pergunto é: Até que ponto a inexistência de critérios claros e específicos para a classificação etária pode deixar de ser uma mera indicação e passa a ser uma espécie de censura, na medida em que inibe o acesso a determinado público.
Se a minha pesquisa estiver correta, o órgão responsável pela classificação indicativa é o Ministério da Justiça sendo que pelo que eu pude notar, os produtos que requerem classificação são específicos, ao menos existem fichas especificas a ser preenchidas para RPGs, Jogos Eletronicos e Teatros, Shows e Outros Eventos.
O site do Ministério da Justiça disponibiliza informações sobre a legislação a respeito de classificação indicativa (para encontrar entre NESSE LINK e digite “classificação indicativa” na janela “conteúdo”), mas o que eu notei é que algumas previsões não estão previstas em lei, mas apenas em portarias: É o caso específico de jogos eletrônicos e RPGs (para minha revolta), ambos previstos na Portaria MJ nº 1.100, de 14 de julho de 2006. Nem a constituição, nem o ECA, nem o Código Civil falam em classificação indicativa de produtos (como games, e livros). Vejam alguns trechos:
Constituição Federal de 1988:
Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§ 3º – Compete à lei federal:
I – regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada;Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA):
Art.74. O poder público, através do órgão competente, regulará as diversões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada.
Parágrafo único. Os responsáveis pelas diversões e espetáculos públicos deverão afixar, em lugar visível e de fácil acesso, à entrada do local de exibição, informação destacada sobre a natureza do espetáculo e a faixa etária especificada no certificado de classificação.
O que fica claro para mim quando eu leio os trechos da Constituição e do ECA é que a preocupação do legislador em classificar espetáculos e diversões públicas ele trata de eventos que acontecem em lugares abertos (do tipo, apresentação, parques e coisas do tipo) e não de produtos, quem faz isso é a Portaria que decide inovar com o seguinte:
O MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, no uso de suas atribuições conferidas pelos arts. 1º, inciso I e 8º, inciso II do Anexo I ao Decreto nº 5.834, de 6 de julho de 2006, e considerando:
– que, entre as diversões e espetáculos públicos, os seguimentos de jogos eletrônicos e jogos de interpretação (RPG), de cinema, vídeo e dvd, bem como seus produtos e derivados, apresentam similaridades que permitem discipliná-los num mesmo ato regulamentar;
Não vou me estender no assunto por enquanto, mas a impressão inicial que eu tenho é que a Portaria quis adicionar classificações que a lei não preve, provavelmente para atender interesses ideologicos de determinadas camadas da sociedade. Sobre isso, vale citar mais um parágravo do art. 220 da Constituição Federal:
CF/88 – Art. 220 – § 2º – É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.
Dai eu me pergunto, será que isso não está em desacordo com a previsão Constitucional da Liberdade de Expressão, Na medida em que essa classificação impede que os livros e jogos sejam vendidos em lojas de brinquedos, não seria uma espécie de censura de natureza ideologica? e, nesse caso, será que não caberia uma ação para derrubar essa previsão?
Cara Danielle,
Boa tarde! Tomei contato com o seu “blog” por indicação do “Blog do Igor” e registro aqui os meus parabéns pela iniciativa.
Sua escrita é vigorosa,precisa e com muito rigor técnico.
Agradeço pela generosidade de dividir conosco as suas impressões sobre o Direito.
Com meus votos de sucesso,
Simone
Como bom RPGista (10 anos de jogatina) e geek nas horas vagas vou dar minha opinião breve:
A questão não para somente na censura, que existe SIM e é evidente no meu ponto de vista, mas passa também pela questão de uma sociedade que tem uma visão distorcida do teor dos livros, jogos ou que desconhece o conteúdo desses se deixando levar por imagens, realizando uma análise superficial das coisas.
Com o aumento da violência e um poder executivo e principalmente legislativo que mal sabe se expressar ou mesmo criar leis de maneira eficiente, não é surpresa esse tipo de atitude.
A sociedade nos dias atuais precisa de um bode expiatório para maquiar a verdadeira causa da violência…E os escolhidos sempre são aqueles que tem menos força para revidar ou garantir seu espaço como outros grupos.
Uma verdadeira lei da selva com leves toques de “A Revolução dos Bichos”.
Portanto existe uma clara ofensa a liberdade de expressão e pensamento, em contra partida é fundamental manter uma classificação indicativa que seja eficiente.Haveria assim a necessidade de uma análise do conteúdo destes produtos de maneira acertada e não com base em “achismos”.Na verdade precisamos de menos culpados e mais resultados e soluções, incentivo a criatividade e um pouco da realidade trazida em certos produtos também faz bem a formação de cada um de nós no “país do futebol”.
(não saiu tão breve, mas é isso rs)
Olá,
Faço Direito também, e creio que posso incluir meu nome na vasta lista da comunidade “gamer” brasileira.
Falarei apenas sobre um aspecto do post: o de julgar o RPG apenas um produto, e não um evento aberto.
Ao adquirir acesso a qualquer MMORPG, estamos expostos a milhares de pessoas. No mundo dos jogos, é possível interagir com vários tipos de pessoas ao mesmo tempo. Dessa forma, é compreensível que o legislador entenda o jogo como um evento: muitas vezes, é isso mesmo. Um evento virtual, mas um evento. Os MMOs tem um público alvo específico, apesar de atraírem muitos fora desse nicho: crianças e adolescentes convivem diariamente com pessoas às vezes muito mais velhas que elas. E estão sujeitos aos costumes e linguagem dessas pessoas. Infelizmente, a autoridade paterna nesse quesito fica prejudicada: O pai, ao entrar no quarto do filho e ver uma série de bonequinhos na tela, acha normal. Apens um jogo, como PacMan e outros. Mas o pai não sabe quem comanda os outros bonecos que estão interagindo com seu filho.
Assim como você, não defendo a proibição sumária de jogos como Counter Strike. No caso deste jogo em particular, todo o caso foi infundado: o chamado “CS” é um jogo muito antigo e pirateado. Qualquer um que tenha o conhecimento necessário pode abrir e hospedar um servidor para jogá-lo, e customizar o jogo a seu bel prazer, então chamar os amigos e fazer uma festinha – o caso da versão CS no Rio de Janeiro é exatamente esse: customizaram o jogo, viram que fazia sucesso e puseram à venda, nos melhores camelôs. Não se assemelha à versão oficial do jogo em quase nada.
Fica também evidente a ignorância dos operadores do Direito, que afinal não conhecem o produto em questão e julgam sem saber de todos os fatos…
Mais tarde analiso com mais calma.
Oie Raphaella,
Desculpe mas vou ter que discordar de você, RPG e MMORPG são coisas bem diferentes. Os livros de RPG não são eventos, são produtos (livros) e esses produtos são obrigados a mencionar classificação indicativa.
Os eventos de RPG sim, poderiam até ser classificados, afinal são eventos publicos. Mas se assim fosse, também deveriam sê-lo todas as baladas e encontros de qualquer tipo.
Quanto aos MMORPGs, note que eles são muito mais recentes que o RPG ou mesmo que a maioria dos games e não são, em geral, o maior alvo dessa portaria que está muito mais ligada aos RPGs.
Veja bem, na verdade, eu não tenho nada contra classificação indicativa, porque ela é justamente o que o nome diz: indicativa. Mas é preciso ter cuidado, eu acharia justo se a categoria LIVROS fosse obrigada a ter classificação indicativa e dentro dessa categoria os LIVROS DE RPG também a recebessem; ou que a categoria JOGOS fosse (e dentro dela JOGOS DE RPG).
O que me parece injusto é discriminar esse produto e essa discriminação acabar se estendendo não apenas para a necessidade de classificação, mas na propria classificação (que é determinada pelo ministério obviamente sem nenhuma lógica de caracterização).
Anyways… como boa RPGista faço questão de ressaltar: MMORPGs estão mais para jogos eletronicos do que RPGs.
Concordo E discordo, em alguns aspectos. Concordo no tocante aos livros de RPG e até achei uma discrepância absurda hoje mesmo, numa livraria:
Os livros de Harry Potter estavam expostos na seção “infantil”. E, um pouco mais além, na categoria “Adulto – Ficção”, encontrei um guia de RPG baseado em Harry Potter. Folheei rapidamente: os mesmos personagens, basicamente a mesma história, nada no enredo que pudesse justificar conteúdo adulto. Então qual o sentido da diferenciação?
Discordo a respeito dos MMOs. Afinal de contas, simplificando bastante, eles só nasceram da vontade do pessoal de jogar RPG pela internet. Juntou-se a fome com a vontade de comer e bum, World of Warcraft! haha
Atualmente, os MMOs estão cada vez mais puxando o lado do joguinho. Mas isso não se deve à estrutura dos mesmos, e sim às massas dominantes nas comunidades. A imensa maioria dos jogos em voga hoje tem uma carga histórica muito rica, e 99% do conteúdo dos mesmos dá uma partida e tanto. Mas o pessoal prefere valorizar mais o lado mecânico da coisa e deixar a parte do role playing de lado – o que é triste e caracteriza prejuízo só pra eles, que pagam a mensalidade e não utilizam quase nada dos recursos que adquiriram.
Nesse quesito acabamos por encontrar uma série de fatores sociológicos que justificam essa atitude…
Mas ainda assim, não se pode esquecer que em MU online e Ultima Online, que são jogos razoavelmente antigos, não adianta montar um bonequinho lindo se não tiver cabeça pra jogar RPG puro. Porque a mecânica desses jogos depende demais disso.
Também é possível observar que, mesmo com a demanda massiva pelo aprimoramento da parte mecânica do jogo, as empresas buscam cada vez mais adaptar seus jogos para o RPG puro. Elas simplesmente perceberam que, se não houver uma história boa pra embasar a mecânica, o jogo fica defasado e morre.
(perdão se falei besteira. De RPG puro, eu realmente conheço pouco.)
Concordo com a diferenciação estrita das categorias. Pois dessa forma, abriríamos margem para demandar legislação adequada no país – por não termos(não que eu conheça) nenhuma norma que regule o mundo virtual, especialmente o mundo dos MMOs, os consumidores desses produtos ficam à míngua. Afinal de contas, é bem vaga a definição de prestação de serviço dentro de um MMO. Mais vaga ainda a responsabilidade objetiva da empresa em caso de dano – material ou moral – ao bonequinho. Muitos crimes ocorrem no mundo virtual, e os ofendidos acabam indefesos e sem obter nenhuma justiça. Não há lei que os ampare, e mesmo que consigamos de alguma forma achar uma que o faça… É difícil.
Hun… não sei, para mim é dificil ver MMOs como RPG puro, pelo mesmo motivo que eu acho que D&D por exemplo, está cada vez mais de distanciando da essencia do que é o RPG.
A questão do RPG é uma coisa bem simples: não é apenas história, mas é basicamente interpretação e isso é algo que nos padrões atuais eu não acredito que possa ser reproduzido no mundo virtual.
O mais próximo que eu já cheguei disso foi jogar usando um programinha que chamava D&D on line, que era basicamente uma espécie de chat com rolador de dados, e dai a dinamica era a mesma do que uma mesa mas à distancia. Ainda nesse caso acho que perdia-se muito no processo.
Veja bem, isso não é uma crítica aos MMORPGs, eles tem suas próprias virtudes, mas acho que essencialmente são coisas diferentes do RPG em sí, justamente porque não tem interpretação ou imaginação, que para mim são a alma do RPG.
Ainda assim cabe lembrar, os MMORPGs ainda que tenham surgido da ideia do RPG ganharam vida própria, público próprio. O que acontece hoje é o oposto, a 4ed do D&D parece estar se moldando para atender mais aos parametros dos MMOs e a esse público.
Isso dava um bom Decodoficando, hein Dona Danielle Toste???????