Como eu comentei a pouco tempo o projeto sobre crimes na internet, acho que vale a pena comentar a matéria que saiu ontem no UOL Tecnologia que fala de algumas questões relacionadas a este projeto.
Ela trata de uma coisa que eu ainda não comentei, que é a questão da privacidade.
Muita gente deve lembrar de uma questão que o artigo comenta, que era aquele previsão de que as pessoas precisariam fazer um cadastro para acessar a internet e coisas do tipo. Bom, desde de quando eu ouvi esse rumor, eu fui completamente contra. Como eu disse no post anterior sobre isso, acho que existem certas características da internet, como a privacidade, que são inerentes a esse meio. Ainda assim, entendo a necessidade de se criar alguma maneira de regulamentar a punição de atos criminosos (ou que ainda não estejam tipificados, mas são reprovados pela sociedade e cujo tipo penal deve ser criado com essa nova lei).
Esse problema não é atual, nem surgiu com a internet. Como encontrar um meio termo entre a liberdade e segurança? como o Estado pode tutelar as condutas da sociedade e ao mesmo tempo respeitar a liberdade dos indivíduos? Parece evidente que nós abrimos mão de parcela da nossa liberdade para constituir uma sociedade civil, e isso foi abordado exaustivamente nas teorias do contrato social. Ora, se a nossa liberdade termina onde começa a do próximo, como podemos delimitar essas liberdades e proteger ambos os interesses?
Eu acho difícil encontrar uma resposta para essa pergunta, mas acho que cabe aos legisladores, contanto com a ajuda de profissionais especializados da área, tentar identificar a melhor maneira de conciliar os dois interesses. E se não houver maneira de o Estado tutelar as condutas na internet sem uma privação significativa da privacidade dos individuos, porque não submeter essa melhor solução encontrada ao julgamento do povo? Porque não fazer um referendo e deixar que as pessoas decidam se vale à pena abrir mão de parcela da sua privacidade para garantir uma melhor fiscalização dos delitos por parte do Estado? Eu sei que temos certo receio de submeter questões complexas à análise do povo, devido à falta de informação e coisas do tipo, mas se não levarmos a informação às pessoas, e permitirmos que elas tomem suas decisões e aceitem as consequências dessas decisões, como vamos construir um país que atenda às expectativas da sociedade? como vamos dizer que se trata de um país que tem o povo como soberano?
De qualquer maneira, me preocupa não apenas a questão da privacidade, mas da liberdade de expressão. Acho até que essa é a minha maior preocupação. As vezes entendo que as pessoas confudam discriminação com preconceito, e não os vejo como a mesma coisa. Embora pessoalmente eu considere ambos como sendo reprovaveis, a descriminação é uma forma de agreção, mas o preconceito, isoladamente, não.
Quando falam dos crimes de racismo na internet, as vezes eu me preocupo se estamos condenando atos que ofendam a “raça” envolvida ou atos que sejam mera expressão de opinião.
Acho que não se deve simplesmente privar às pessoas o direito de gostar ou não de determinada coisa (raça, sexo, etc.) ou de expressar suas opiniões a respeito, mas justamente debater o assunto abertamente, buscando estabelecer motivos pelos quais não gostar de determinado grupo em virtude de tal qualidade é um ato irracional, buscando refutar as razões que levem as pessoas a esse ódio, porque só assim pode evitar não a manifestação do sentimento, mas a existência desse sentimento.
Talvez pareça que eu estou fugindo um pouco do tópico, mas na verdade, isso faz parte, porque justamente os motivos pelos quais o legislativo está buscando maneiras de identificar os usuários, são principalmente a incidencia de pedofilia e racismo, que precisam ser punidas. No caso da pedofilia, não há o que se falar, mas no caso do racismo, ou mesmo o sexismo, me preocupa bastante que se confunda os limites entre opinião pessoal e discriminação (por exemplo: entre qual é o limite no qual, um machista pode acreditar que os homens sejam melhores que as mulheres, e de fato estender esse pensamento para as suas ações, tratando as mulheres como inferiores.).
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Em 23 de maio de 2007 – Edição – Adição de dados
Só para aproveitar esse post, consegui achar na net o ultimo substitutivo do projeto sobre crimes na internet (PLC 89/2003; PLS 76/2000; PLS 137/2000). A qualidade está péssima, mas é o único que encontrei, se achar um melhor eu substituo o link.
Encontrei esse substitutivo no portal Safer Net Brasil, que está super completo, com o acompanhamento do processo, todos os substitutivos, e uma lista de noticias a respeito. Então, apesar de normalmente eu tentar recomendar só os sites oficiais, como o site do senado não disponibiliza os textos integrais e os substitutivos, recomendo esse site para quem estiver acompanhando que parece bastante confiavél (mas fiquem sempre de olho no acompanhamento do Senado também).
Dani…
Vou ler tudo qdo chegar em casa, mas vc está totalmente enganada quanto a privacidade da internet.
As pessoas de bem, que assinam um provedor e não utiliza nenhum sistema para navegar anônimo são facilmente rastreadas. Se por acaso você em sua casa invadir o site da microsoft Brasil, eles simplesmente pedem para o provedor falar quem estava usando aquele IP naquela hora exata.
Claro que isso somente mediante a algum pedido da justiça, mas em casos graves (como a criação de um supervírus), isso é facilmente liberado.
Jo,
Mas no caso, o provedor só vai rastrear esses dados se a policia ou algum outro orgao do governo solicitar, não é? O provedor não fica “vendo” o que você está fazendo o tempo todo para denunciar se você fizer alguma coisa ilicita, fica?